Entrevista com Ilca Ângela, atriz do Rio de Janeiro

1 - Qual o significado do Teatro para sua vida?

Pra mim, o Teatro significa um divisor de águas: quem eu sou, pra onde eu vou, e onde pretendo chegar, enfim. É como a água que se bebe, ou como o ar que se respira. Estar sem  subir nos palcos significa uma morte lenta, ou um masoquismo. Viver sem Teatro é viver sem plenitude.

2 - Como você tem visto o papel das periferias e dos negros dentro do teatro?

Teatro é vida. Através dele, você aprende a valorizar mais a si mesmo, e a se identificar enquanto indivíduo em uma sociedade. O Teatro também carrega a questão política, onde ele cumpre o seu papel de transparecer a realidade de uma sociedade, ou de um povo e sua cultura, de modo que todas as classes, por mais que permaneçam sem efetivas ações de mudança, conseguem obter sensibilidade para enxergar as diferenças e respeitá-las.

Levando em consideração que o papel do Teatro é educar, as periferias e favelas estão mostrando seu valor através dessa ferramenta de comunicação, usando as possibilidades de abertura de portas e janelas que ele dá, com a conscientização, aprimoramento e entendimento da vida, e do papel do cidadão na sociedade. Assim, tenho visto o papel das periferias sendo concretizado com êxito, embora com muitas divergências e falhas ainda - natural por conta da lentidão do sistema -, extremamente importante para o reconhecimento dessa parte excluída da sociedade.

Os negros no Teatro é algo que, infelizmente, até hoje, ainda é uma novidade, pelo esforço que ainda se busca em conquista de valores. Mas, aos poucos, estão (estamos) impondo o seu (nosso) valor. Em uma época não tão distante, onde atores brancos pintavam a pele para representar um personagem negro, ter hoje protagonistas negros é um grande avanço. Mas ainda não está como a classe militante gostaria que estivesse. Ainda faltam grandes avanços de valorização e respeito.

3 - Qual a diferença do Teatro feito para palco e do Teatro para a Televisão?

São muitas as diferenças! Teatro ao vivo, seja em arena, mambembe ou palco tradicional, é uma experiência bem diferente da Tv. Para o ator, fazer ao vivo significa nem sempre poder errar; dominar o tempo certo do drama ou da comédia; conquistar o público para aquela situação e ter a resposta imediata de perceber se está conseguindo realmente entretê-lo. Para mim, estar no palco e não ver ninguém dormindo significa que eu fiz um bom trabalho. Preciso fazer o cara da primeira fileira rir, assim como o a da última, que já não vê meu rosto com detalhes. Assim como, na mesma situação, preciso fazer esses dois caras acreditarem na intensidade do meu drama quando eu estiver chorando no palco.

Na tv, a coisa já rola de forma diferente: o ator pode errar, porque as cenas são cortadas, editadas, selecionadas. Mas é claro que também é exigido uma boa performance, visto que há uma equipe inteira em prol de uma cena bem feita. Ou seja: quanto mais o ator erra, por mais tempo o trabalho se estende, e mais a equipe se cansa. É preciso estar atento à isso.

Além disso, as câmeras de última geração captam todas as expressões possíveis de um rosto. Portanto, embora a estética seja algo primordial para esse veículo, não se sobrevive muito tempo na tv, se não se tem o talento trabalhado para te defender.

Para o publico, ir ao teatro custa caro, simplesmente pq ele não percebe que ele paga muito mais em todo o acesso às publicidades que novelas e comerciais provocam nele, enquanto telespectador daquele programa / horario. Para o ator, fazer tv é mais produtivo em termos de conhecimento e popularidade, pois a mídia é a arma mais poderosa hoje em dia, que abre muitas possibilidades para o trabalhador em questão. No Teatro, se não há atores conhecidos pelo público, geralmente o espetáculo fica vazio, propenso à não conseguir responder financeiramente àquele custo, o que gera dívidas para o ator, já que ele paga a diária de permanência de um teatro. Além disso, é extremamente frustrante ter um espetáculo vazio.

Aqui, confirmo o que todo ator diz: não há tesão melhor como o que o teatro proporciona. Mas tv também é muito bom de se trabalhar e ver respostas, mesmo que sejam posteriores.

4 - Como avalia o mercado do teatro no Rio de Janeiro, seja do ponto de vista do acesso como da valorização financeira?

O acesso ainda é pouco, embora esteja melhorando bastante. Mas a grande massa só tem o costume mesmo de ver televisão, seja pela vida difícil, seja pelo custo de pagar a entrada. A linguagem do teatro, em sua maioria, também é diferente, não tão popular quanto a linguagem televisiva. Sendo assim, já vi muitos casos em que pessoas reclamam de não terem entendido a peça. E com a falta de estimulo, acabam não indo mais. E teatro, tanto para atores, quanto para publico, é questão de exercício da prática.

A valorização financeira é praticamente nula. Se não tiver um ator reconhecido na peça, ou um bom patrocínio para bancar custos, a produção não sobrevive por muito tempo. Por isso, se insiste tanto no famoso (e absurdo) amor à arte, onde reza a lenda que nós, atores, devemos fazer um espetáculo sobreviver apesar de todos os pesares. E assim, em uma produção pobre, os atores acabam sendo os próprios patrocinadores, onde desviam verba pessoal para custear despesas profissionais. Também por isso é comum vermos alguns atores frustrados com a profissão, e migrando para outras que possam mantê-lo com as contas em dia, e com o sustento da família.

5 - Qual contribuição a internet trouxe para o teatro e quais possibilidades os artístas podem ter dentro dessa mesma internet?

A internet facilitou muito a vida dos atores, mas também é uma questão a se discutir. Muitas companhias teatrais estão desenvolvendo projetos para realizarem peça próprias para o veiculo / formato web. E também tem sites que facilitam a vida do ator e do publico, vendendo peças online, que foram gravadas com muita qualidade de imagem e registro de som, para que o mesmo aconteça com perfeição.

Para os artistas, a internet acaba sendo um veiculo importantíssimo, pois abre portas para ele se vender. A questão a ser discutida é que isso se torna perigoso, a partir do momento que perde-se a originalidade de se mostrar. Portanto, essa arma maravilhosa que temos hoje nas mãos merece ser repensada a cada dia, para não cair na mesmice e na chatice. Mas não existe a menor possibilidade de descartá-lá.

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